VIAJADA, POLIGLOTA, VIVIDA, ESSA É GEISA MARANHÃO

AMARA: Meu nome é Amara Moira,
moderadora da página “E Se Eu Fosse Puta – Amara da Depressão”, e
estou aqui hoje para entrevistar uma convidada especialíssima, uma convidada
babadeira, uma convidada bafônica, Geisa Maranhão, diretamente do Itatinga,
diretamente do Maranhão. Palavras inaugurais de quem é você… quem é você,
quem é Geisa Maranhão?

GEISA: Meu nome é Geisa Maranhão,
sim eu vim do Maranhão, já estou aqui em Campinas há alguns anos, treze,
catorze anos… [AMARA: Uma campineira!] já quase uma campineira, e eu gosto de
Campinas, gosto do Maranhão tb, mas gosto muito mais de Campinas.

AMARA: Bom, uma coisa que eu vejo
na história de muitas travestis que conheço é que elas em geral já tem toda uma
experiência sexual que vem desde a adolescência, várias experiências, em geral
como passivas, com ocós maravilhosos, e aí de repente elas entram pro mundo da
prostituição imaginando que vão encontrar um boy-magia e… o que acontece, como
é essa relação entre o que era antes e o que é depois? E como foi se tornar uma
travesti pra você?

GEISA: Ser travesti já era algo
que eu queria. Eu acredito na verdade que eu já nasci travesti, eu não me
tornei travesti, já nasci assim, e sou muito feliz de ser quem eu sou, de viver
como eu vivo. Em relação à prostituição, antes de trabalhar fazendo programas, eu
tinha sim relações sexuais com pessoas que eu gostava e, sim, eu era sempre
passiva, eu era sempre a passiva. Com a prostituição isso já mudou um pouco, eu
tive que me tornar ativa, mesmo imaginando que isso não seria possível… eu me
tornei uma pessoa ativa por conta do trabalho mesmo, porque você imagina que
vai ser sempre passiva, sempre uma garotinha dos homens, o que não é verdade.

AMARA: Sua primeira vez, como
foi?

GEISA: Minha primeira vez, no
programa, foi terrível. Eu não sabia o que fazer, eu imaginava que eu seria
passiva, que eu taria ali pra fazer um sexo normal como homem e mulher fazem, e
o que aconteceu foi que o cliente começou a me tocar em partes que eu ainda não
tinha sido tocada nesse intuito, de sexo, e foi algo muito estranho pra mim.
Comecei a gritar com o cliente, falar pra ele que ele estava ficando louco,
como ele era capaz de me tratar daquela maneira, que aquilo tava errado e que
eu não queria aquilo, que acabasse o programa ali mesmo. E foi o que aconteceu.
Acabou o programa, não consegui fazer e fiquei me martirizando alguns dias,
será que eu vou ter que fazer o que eles querem? Até que as amigas me
convenceram de que eu teria que ser ativa, que eu teria que usar esse lado pra
trabalhar.

AMARA: Uma coisa que eu também
ouço muito é que, na prostituição, às vezes é até melhor ser ativa porque o
programa acaba mais rápido.

GEISA: Ah, eu gosto, prefiro, ser
ativa no programa do que passiva, porque sendo ativa o prazer vem mais rápido
pro cliente e já logo termino o que temos que fazer, já me pagam, vão embora. E
assim já tenho mais tempo livre pra pegar outro cliente.

AMARA: E, ããã, pergunta óbvia,
né?, dá pra sentir prazer com cliente? Como é que dá pra sentir prazer?

GEISA: Sim, sim. Dependendo do
cliente, isso varia de cliente pra cliente, se um cliente, ai, boy-magia,
escândalo, aquele bofe, que te trata, que vem no momento certo, você tá
estressada, você tá louca, e vem com toda a calmaria do mundo te acalmar, te
acariciar, te fazer sentir sensações… você acaba sentindo prazer sim, um
prazer muito grande.

AMARA: E uma pergunta também que
sempre aparece, ouço bastante, recebo bastante inbox lá na minha página, é aí,
se aparece uma neca gigantesca, que é que você faz? Eu que sou a inexperiente,
eu dou pra trás, não dá pra mim não… como é isso pra você?

GEISA: Eu me sinto desafiada, eu sinto
que pra mim é um desafio. Até hoje não corri da raia. Cada vez que eu vejo uma
neca enorme eu fico meio na dúvida, será que vou conseguir, será que não vou
conseguir? Mas não fico é sem tentar. Sempre que apareceu eu dei conta do
recado, nunca fugi da raia, meu amor. Adoro uma neca odara, gosto bastante, até
prefiro. [AMARA: Dói o maxilar, dói tudo]. Quando eu vejo que dói o meu maxilar
já no início da relação, na chupeta, eu me sinto desafiada, eu sei que vai ser
um pouco complicado. Mas nada que um carinho aqui, um carinho ali, um gel: com
cuspe e jeito, entra em qualquer sujeito.

AMARA: Essa frase é muito boa! A
outra pergunta que sempre surge e que eu tenho que fazer pra você é dá pra
ficar rica como prostituta, como é que é isso?

GEISA: Ficar rica ficar rica,
acredito que não dê, rica milionária. Isso depende de cada pessoa, como ela
administra o seu dinheiro. Mas dá, sim, pra se viver bem, bem mesmo. [AMARA:
Vejo muitas bancando família]. Sim, é um dinheiro que, se utilizado de boa
maneira, ela é bem aceito em algumas famílias. É o que acontece no geral com a
gente, travesti, que trabalha na rua, com prostituição a maioria das vezes: por
mais de horrível que tenha acontecido com a gente durante a moradia com a família,
é o que nos salva esse prazer de poder ajudar eles, mantê-los. E eu acho que é
um pouco, é uma forma de você se dar à sua família, mesmo depois de tudo o que
você passou ali. Acho que é um trabalho gratificante pra gente, poder ajudar. E
trabalhando na prostituição dá, sim, pra ajudar bastante, bem mais do que imagina.

AMARA:  Bom, pergunta final que eu tenho pra você,
Geisa, é: você viveu muitos anos em Campinas, mas você não viveu só em
Campinas, você é vivida no mundo, você é uma pessoa que rodou o mundo… e aí,
faz uma comparação pra gente entre Campinas e o Boir de Bologne em Paris?

GEISA: Só assim, pra começar,
quando eu saí do Maranhão pra vir pra Campinas, com o desejo de me tornar
travesti, de ser quem eu sou hoje, eu achava que já seria um grande passo ter
saído do Maranhão e ter chegado em Campinas. Só que Campinas me abriu as portas
pro mundo, eu consegui atravessar o oceano, fui até Portugal, Espanha, até
chegar em Paris, onde eu me senti mais à vontade pra ficar, pra morar, pra
trabalhar. E Paris foi uma grande escola pra mim, tive muito aprendizado lá. E
em comparação, Paris com Campinas, eu posso comparar Paris com o Brasil, porque
é completamente diferente: as pessoas te tratam bem, as pessoas não te vêem
como um objeto, como algo estranho, lá todo mundo é igual, as pessoas te cumprimentam,
como ser humano. E em forma de trabalho, também é bem melhor pra se trabalhar,
os homens são mais cultos, mais educados – não que os brasileiros não sejam
educados, mas eles tratam a gente de maneira diferente lá. Claro que também tem
os passivos, como em qualquer outro lugar do mundo. E o Boir de Bologne é como
se fosse uma zona a céu aberto, a diferença é que você tem algumas privações
tendo que trabalhar no Boir de Bologne, especialmente se você é imigrante
ilegal. Não é como se trabalha no Brasil, que você pode fazer o que você quer,
mas o Boir de Bologne, eu não sei agora, mas já foi uma mina de dinheiro, onde
várias ficaram ricas… [AMARA: Lá dá pra ficar rica?] Lá sim, pelo menos deu
pra alguém aí ficar rica. Mas a França é sim um lugar maravilhoso, não me
arrependo nem um pouco de ter deixado o Brasil, de ter ido explorar outros
países, eu aprendi muito com essa ida.

AMARA: Essa foi a entrevista com
Geisa Maranhão, essa entrevistada poliglota, fala francês, fala espanhol, fala
português, fala italiano, fala o que for necessário, viajada, vivida, pessoa
incrível, militante… gostaria de fazer suas considerações finais?

GEISA: Tá. Na militância, digamos
que eu estou começando a me envolver mais profundamente agora. Esse ano
pretendo me lançar, me jogar mesmo, em tudo o que eu puder fazer, eu vou fazer,
eu vou contribuir, pra que as pessoas possam ver que nós, travestis e
transexuais, somos gente como todos os outros seres humanos da face da Terra.
Eu espero alcançar poder fazer o máximo de coisas possíveis pra que as pessoas
possam ver isso, né?, que a gente é gente. Ah, e outra coisa, eu Geisa Maranhão
não sou travesti, não sou transexual, não sou trans nada, eu sou gente, ser
humano, sou eu, Geisa Maranhão. [AMARA: Em primeiro lugar!]. Em primeiro lugar
e em último lugar também, eu sou Geisa. Muito obrigada. Beijinho a todas.

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