Um ano exato atrás, e eis a data em que tudo começou, onde finalmente me encontrei Amara. Atiçada por amigos, me montei dominatrix toda caricata o primeiro dia, chicotinho peruca e salto, daí o segundo idem, o terceiro tb, o quarto e o quinto, continuando montada após o Carnaval pra desespero dos meus pais (agora mais feminina, mas sem ainda assumir nada, pq eu ainda tava no processo de descobrir). Dia Internacional da Mulher pouco depois, fui toda produzida no salto, saia e blusinha participar do ato, saindo dali direto pra festinha em família… pra minha surpresa, todos me trataram super bem (“é brincadeira, só pode! hahaha”), os primos risonhamente me chamando de Amara, me apresentando pros convidados como “a prima mais velha” — hoje nenhum deles consegue me tratar igual aquele dia, travam pra me dar um simples beijo no rosto ao invés do habitual aperto de mão. Qdo não era “sério”, tava valendo.
Meses atrás fui numa festa xis e pessoas me paravam o tempo todo pra perguntar se eu tava fantasiada (por estar usando roupas femininas, peruca, maquiagem)… só depois fui me dar conta dq aquela era uma festa a fantasia. Um homem então me agarrou no escuro, bêbado bêbado, o primeiro que me beijava dsd que me assumi, aí do nada ele me empurra e sai correndo, os amigos visivelmente enchendo a paciência dele no caminho: teria só percebido que eu era trans qdo começou a me beijar ou, pior, teria achado que eu era um homem fantasiado? Tive medo de apanhar enqto não me vi longe da festa.
Carnaval, data super risonha, pode ser paraíso pra muito homão angustiado com as amarras firmes do machismo, do sexismo, mas convém analisarmos tb os sentidos que ele projeta pras pessoas trans. Eis um espaço onde vão nos perguntar a todo momento se nossa identidade visual é fantasia (aí tudo bem) ou pra valer (aí melhor evitar, ou até dar um basta), lugar onde temos que tomar cuidado ao interagir com bêbados e com machões LGBTfóbicos que podem não se dar conta, dsd o princípio, dq somos trans / travestis (dps nos culpando pelo desejo que sentiram por nós), lugar onde vão nos assediar por graça, sem querer querendo, onde vão passar a mão nas nossas bundas o tempo todo (“é homem fantasiado, não dá nada, ele tá pedindo”), tratar nossos corpos como se fossem públicos…
Um ano atrás eu me encontrei nesse espaço e sou muito grata a ele por isso, mas hj tenho medo só de pensar que ele se aproxima. E isso diz muito a respeito de o qto homens cis purpurinando nas avenidas servem pra diminuir a violência aq nós trans e travestis estamos sujeites.
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